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Dia 03 de Março de 2009, às 08:10 h, este que lhes escreve foi, na melhor forma de definição, atropelado por um, ou melhor, dois bandos de animais sem rabo.
Isso mesmo, animais sem rabo. Fossem animais com rabo, por serem totalmente irracionais, eu até desculparia o gesto, mas animais sem rabo, com uma postura quase humana, sustentados por duas pernas devidamente coladas ao tronco de onde saem, também, dois braços e uma cabeça que, teoricamente, teria o recheio de um cérebro pensante.
A estes eu não posso desculpar. Posso, até, procurar entender, concluir que carecem de algo importante, de um berço, mas, desculpar, jamais.
Vamos aos fatos.
Na terça-feira saí de casa, bem cedinho, no horário de costume, para cumprir mais uma jornada profissional. Fiz o trajeto habitual. Ônibus até o terminal Jabaquara, metrô até a estação da Luz e, ali chegando, embarquei no trem que me levaria ao município de Guaianazes. Por volta de 08:10 h, com o trem chegando no terminal, me preparo para desembarcar.
Sei, com certeza, a dificuldade que é fazer esse desembarque, O populacho que aguarda a composição para embarcar, independente de todas as solicitações e avisos para que espere primeiro o desembarque, não dá sinais de aceitar as recomendações.
Por outro lado, os passageiros dentro do trem pretendem desembarcar e dar continuidade aos seus afazeres.
Pronto! Está totalmente preparado o cenário para a batalha final.
Eu, buscando fazer valer os meus direitos de cidadão, estou na frente da massa que pretende desembarcar.
O trem pára. Abre as portas e tem-se início a grande aventura.
Sou empurrado por uma manada de animais sem rabo, até eu, na minha saga de buscar a justiça, me transformo numa rês desta manada.
À nossa frente outra manada tenta entrar no trem.
Vai e vem. Empurra e é empurrado. Pronto. Acontece. Sinto meu corpo (110 kg, mais ou menos) ganhar o espaço e começar a cair pelo vão existente entre o trem e a plataforma da estação.
Com rara agilidade, recolho o braço esquerdo de forma a fazer dele o aparadouro que não me permitiria espatifar nos trilhos da ferrovia.
Vejo as coisas voarem. Óculos voam para trás, minha pasta pula para frente.
Alguns desses animais, demonstrando uma nesga de solidariedade, me alcançam com as mãos nervosas e, por fim, me arrastam até a plataforma. Vejo alguém me devolver os óculos, outro me entrega a pasta que não consigo segurar com a mão esquerda, pois uma tremenda dor toma conta de todo o meu braço.
A perna também dói e quase não consigo me manter em pé.
Os seguranças chegam e me fazem as perguntas de praxe, pedindo para acompanhá-los. Vou me arrastando.
Tem início, então, as tentativas de me ajudar, “pero non mucho”.
Levam-me numa viatura até o hospital estadual e o segurança que me acompanha faz com que minha espera seja abreviada ao máximo.
Estou, então, em frente ao ortopedista que me olha e pergunta: O que aconteceu com o senhor?
Como saber responder se não sou médico, muito menos ortopedista?
Ele pede que me levante, alcança meu ombro com seu longo braço, apalpa e diz: O senhor deslocou o ombro? Quase lhe pedi desculpas pelo inconveniente, mas a dor, de tão forte, não permitiu. Fez uma guia, encaminhou para eu tirar as devidas chapas de RX e voltar.
Chapas na mão, volto à presença do senhor doutor que as olha de relance e diz: Vá para a sala de gesso que logo mais estarei lá. Aguardo a presença do médico e fico sabendo, pelo enfermeiro, que o doutor vai fazer a “redução” do meu ombro. Alguns minutos mais tarde vem o médico, me chama, manda que eu deite numa maca, pega meu braço e começa a fazer alguns movimentos para promover o encaixe. A dor era muita e eu retesava os músculos. Tanto o médico quanto o enfermeiro só pediam para que eu relaxasse. Juro! Nessa hora, me lembrei de Marta Suplicy.
Nova tentativa e nada. Diz, então, o médico para o enfermeiro: aplique 10 ml de xilocaina. Caso não dê certo, mandarei internar e faremos anestesia geral. Jesus! Isso não! Senti a picada da injeção, vi o senhor doutor se aproximando, senti novamente dores atrozes que, sob o efeito da xilocaina, foram minorando e, de repente, ploc... O ombro estava no lugar.
Virou-se o médico para mim e perguntou com toda a malícia possível: Sentiu entrar?
Quase que minha resposta foi dada como se eu também fosse um animal sem rabo. Mas, me calei e percebi que havia sobrevivido.
Menos mal!
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